Será que o céu existe? Se existe onde ele está? Será que é apenas o firmamento que está lá em cima? O presente artigo busca dar uma resposta a estas e outras perguntas. No decorrer do mesmo procuramos demonstrar que o céu não é apenas uma realidade que começa aqui e agora. Trata-se sim de um estado de vida que começa aqui e continua depois na eternidade. O céu antecipado aqui na terra nada mais é do que a experiência de comunhão que fazemos com Deus, conosco mesmos, com o nosso próximo e com toda a criação.
1. Abordagem inicial
Estamos iniciando nossa reflexão sobre o céu. Mas antes de iniciá-la, uma pergunta se faz indispensável: o que nos vem em mente quando inicialmente e na maioria das vezes ouvimos tal palavra? De imediato, a primeira imagem que geralmente temos é a do céu que está sobre nós. Ele é azul, às vezes está nublado com nuvens brancas ou cinzas e não pode ser bem visualizado. A criança desde cedo aprende com a mãe a falar «papai do céu». E quando pergunta onde está Deus, a resposta dada é: «lá em cima, no céu!» Mas também sabemos que além do azul celeste existem várias camadas como a cromosfera, estratosfera etc. Temos o espaço sideral, a camada de ozônio, o assim chamado buraco negro etc. O que surge nesse caso é uma visão recebida por meio das informações dadas pela ciência e tecnologia.
Mas onde está Deus nisso tudo? Pois afinal de contas dizemos que ele está no céu! Na verdade ele também está presente nisso tudo, pois é o autor de toda a criação, a qual foi feita com perfeição (cf. Gn 1,31). Porém, o céu não é apenas uma realidade que está lá em cima, é um estágio de vida que começa aqui em baixo, na terra. Deste modo, o céu não é apenas um estado de vida que existe após a morte, mas começa aqui, embora ainda não seja experimentado de modo definitivo e perfeito. Assim, não quer dizer que tudo será destruído com a morte: «a nossa comunicação com outras pessoas e as nossas relações com elas não serão destruídas pela morte» .
Na maioria das vezes, ao depararmo-nos com a palavra céu, pensamos também em um estado de vida onde tudo é perfeito. Imaginamos um mar de rosas. Um lugar onde a natureza é linda, com plantas, flores, água correndo e frutos em abundância: «a imaginação poética de Efrém vai além da prometida ressurreição. Em seus Hinos do paraíso, descreve as alegrias do céu em cenas de rica e delicada beleza cuidadosamente esculpidas» . Trata-se de um lugar de delícias, com manjares apetitosos e fontes que jorram leite e mel. No mesmo não há dor, dificuldades, enfim, nenhum sofrimento. Não se conhece o ódio, a inveja, o rancor. Não existe nem mesmo a infidelidade ou a corrupção. Todas as pessoas são perfeitas, não há lugar para a doença e reina a paz e a tranqüilidade.
Na verdade, o céu é um lugar de paz e tranqüilidade, porém não se trata apenas disso. Eternamente falando, podemos imaginar o céu como algo perfeito, sem sofrimento, porém, nesta vida, podemos também experimentá-lo mesmo diante do sofrimento e da dor.
A auto-suficiência que faz com que nos encaminhemos sem Deus, não se faz presente nessa imagem que temos do céu. O orgulho que nos afasta do Criador e do próximo não encontra morada nesse estado de vida . Isto porque se vive em perfeita comunhão com Deus . Assim, «Deus chamou e chama o homem para que ele, com a sua natureza inteira, faça sua adesão a ele na comunhão perpétua da incorruptível vida divina» .
Mas, neste modo de ser, não se vive em comunhão apenas com Deus. A comunhão também se faz presente conosco mesmos, com o próximo, enfim, com todas as criaturas.
A comunhão conosco mesmos é dada por um modo de ser que não conhece a divisão. Nessa integração nos aceitamos e vivemos em paz conosco.
A partir da comunhão consigo, o ser humano vive em comunhão com o seu próximo onde não se conhece o ódio, o rancor, a vingança, enfim, tudo aquilo que nos destrói e destrói também o outro.
A comunhão com todas as criaturas se dá pela disposição em não destruí-las, mas usá-las para os devidos fins. A partir da mesma a natureza não se volta contra o ser humano, vingando-se dele.
Até aqui tivemos algumas informações e idéias sobre o céu. Algumas verdadeiras, outras não bem fundamentadas. Deste modo, devemos procurar colocar entre parênteses todos os nossos preconceitos sobre este estado de vida, para que possamos entender o seu sentido originário . Assim sendo, vamos primeiro refletir um pouco sobre o céu como realidade concreta que começa já neste mundo e, em seguida, passaremos a refletir sobre o mesmo como um estado de vida que continua após a morte.
Este estágio de vida que chamamos de céu, e que sempre se apresenta em nossa visão como um lugar de perfeição, existe sim . Na verdade, o que imaginamos é porque um dia existiu, pode ainda existir, ou continuará existindo. No fundo, ao referirmo-nos ao céu, temos também em mente a imagem do paraíso perdido: «o Senhor Deus, pois, o lançou fora do jardim do Éden, para lavrar a terra de que fora tomado» (Gn 3,23).
A partir da expulsão do ser humano do paraíso, o mesmo só poderá ser reencontrado por meio do sacrifício de Jesus na cruz: «e disse-lhe Jesus: “em verdade te digo que hoje estarás comigo no paraíso”» (Lc 23,43). A sua plenitude será vivida somente na eternidade. Enquanto caminheiros neste mundo, o mesmo só pode ser experimentado vez ou outra, antecipando o que será depois, mesmo em meio aos sofrimentos.
É assim que, inicialmente, a humanidade é criada à imagem e semelhança de Deus . O ser humano, uma vez colocado no paraíso, não conhece a divisão. Há sim uma perfeita comunhão entre ele e Deus . A humanidade contenta-se com Deus e, de modo obediente, o serve: «o Senhor Deus tomou o homem e o colocou no jardim do Éden para o cultivar e guardar. E o Senhor Deus deu ao homem este mandamento: “podes comer de todas as árvores do jardim. Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás, porque no dia em que dela comeres terás que morrer”» (Gn 2,15-17).
Nesse estado de vida, a humanidade não sabe nada acerca do bem e do mal. Vive depositando toda a sua confiança no Criador. O ser humano deixa-se conduzir por ele numa entrega total em suas mãos. Na adesão plena a Deus, lhe é submisso. Reconhece sua dependência do Pai. Trata-se de um estágio de vida onde se vive a plena comunhão . Faz-se presente a experiência da verdadeira liberdade dos filhos de Deus: «o ser humano, em sua origem, só sabe de uma coisa: Deus. A outra pessoa, as coisas, a si mesmo ele só conhece na unidade de seu saber de Deus. Conhece tudo só em Deus e Deus em tudo» . A partir desse modo de viver, o ser humano não coloca nenhuma pergunta ao Criador, mas floresce como a flor, por florescer sem querer saber o por quê de tudo .
Mas como seria o céu depois desta vida aqui na terra? O céu na eternidade nada mais é do que a continuação do estado de comunhão já experimentado aqui na terra. Mas não se tratará de uma comunhão estática. Tratar-se-á de uma vida que continuará tendo sua dinâmica própria, porém, transfigurada: «céu é vida em plenitude e, onde há vida, ali há dinâmica, a dinâmica da vida, que é vitalidade, felicidade e amor» . É por isso que Jesus nos dá uma idéia da vida no céu que começa aqui na terra: «nunca mais beberei do fruto da videira, até o dia em que beberei o vinho novo do reino de Deus» (Mc 14,25). Temos também a imagem de uma festa de casamento: «porém, ele lhe disse: “um certo homem fez uma grande ceia, e convidou a muitos. E à hora da ceia mandou o seu servo dizer aos convidados: vinde, que tudo já está preparado”» (Lc 14,16-17) .
A diferença é que, como aqui na terra temos apenas uma antecipação do que será depois, pois não podemos viver neste estado de comunhão perfeitamente, após a morte o experimentaremos de modo eterno, sem fim: «e irão estes para o tormento eterno, mas os justos para a vida eterna» (Mt 25,46). O que não se dá por acaso, pois o ser humano é chamado por Deus para dar-lhe a sua adesão na comunhão plena . Nesse estado de vida poderemos plenamente contemplar Deus face a face: «porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido» (1Cor 13,12) . Este era o maior sonho de são Francisco de Assis. A morte para ele era bem-vinda porque era a única possibilidade que tinha para contemplar face a face, eternamente, o Deus que em vida podia às vezes experimentar: «depois disso, o santo levantou as mãos para o céu e louvou a Cristo porque, livre de tudo, já estava indo ao seu encontro» . Deste modo, Deus «também é o último fim e a plenificação desta existência. Céu é isso: união íntima, infinita eterna com aquele que nosso coração já buscava, muitas vezes sem o saber» . No seu ser-para-a-morte o ser humano encontra seu repouso definitivo: «como um ser-no mundo lançado neste mundo, o ser-aqui está entre a sua morte. Sendo-para-a-morte, o ser-aqui morre de fato e morre continuamente, enquanto não cessar de existir» .
No céu, Deus nos espera com uma ternura infinita: «então, ouvi grande voz vinda do trono, dizendo: eis o tabernáculo de Deus com os homens. Deus habitará com eles. Eles serão povos de Deus, e Deus mesmo estará com eles. E lhes enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras coisas passaram. E aquele que está assentado no trono disse: eis que faço novas todas as coisas. E acrescentou: escreve, porque estas palavras são fiéis e verdadeiras» (Ap 21,3-5).
Contudo, não se trata de um encontro onde reina apenas uma paz eterna, mas uma vida grandiosa e empolgante, uma tempestade de felicidade que nos arrebata .
Após esta abordagem inicial passaremos a refletir sobre a compreensão do céu nos Antigo e Novo Testamentos.
2. A compreensão vetero-testamentária do céu
Até aqui temos feito uma abordagem sobre a compreensão que, inicialmente e na maioria das vezes, se tem do céu. Procuramos também buscar uma compreensão mais originária do mesmo. De agora em diante, passaremos a refletir sobre a compreensão do céu nos Antigo e Novo Testamentos.
É importante esclarecer que, mesmo já tendo dado algumas fundamentações bíblicas sobre o céu até o presente momento, a partir de agora passaremos a aprofundá-las ainda mais.
2.1 O céu em sentido cosmológico
O céu, em sentido cosmológico, era imaginado no AT como um firmamento sólido onde o Senhor se encontra sentado: «ele é o que está assentado sobre o círculo da terra, cujos moradores são para ele como gafanhotos; é ele o que estende os céus como cortina, e os desenrola como tenda, para neles habitar» (Is 40,22). Antes de formar o ser humano, o mesmo Criador formou o firmamento celeste: «assim diz o Senhor, teu redentor, e que te formou desde o ventre: “eu sou o Senhor que faço tudo, que sozinho estendo os céus, e espraio a terra por mim mesmo”» (Is 44,24). Trata-se do céu no sentido da criação. Porém, no NT, veremos que Jesus Cristo fará surgir novos céus e novas terras por meio de sua obediência até à morte.
Segundo a concepção judaica, acima das águas superiores fica a morada celeste de Deus. O firmamento ou o céu fica abaixo das mesmas. O firmamento tem a semelhança de uma tigela emborcada, sustentada por colunas. As águas superiores caem sobre a terra com chuva de neve através das aberturas (comportas) na abóbada. Rodeada de água, ou seja, pelos mares, se encontra a terra, a qual é uma plataforma sustentada por colunas e pelas águas. As águas inferiores se encontram por baixo e ao redor das colunas. Na morada dos mortos, chamada também «infernos», se localiza o xeol. Os povos pagãos que moravam nas circunvizinhanças tinham esta mesma concepção pré-científica do universo.
2.2 O céu em sentido teológico
Em sentido teológico, o céu é a morada de Deus: «assim diz o Senhor: “o céu é o meu trono, e a terra o escabelo dos meus pés; que casa me edificaríeis vós? E qual seria o lugar do meu descanso?”» (Is 66,1). O seu trono está acima do firmamento: «e viram o Deus de Israel, e debaixo de seus pés havia como que uma pavimentação de pedra de safira, que se parecia com o céu na sua claridade» (Ex 24,10; cf. Sl 104,3). Contudo, Deus não ficará apenas sentado no seu trono, assistindo o desenrolar da história humana, pois no NT assumirá a nossa condição humana por meio de Jesus Cristo.
Deste modo, não se deve imaginar que Deus está circunscrito apenas à sua morada. Por causa de sua onipotência e onipresença, ele se encontra em toda parte: «mas, na verdade, habitaria Deus na terra? Eis que os céus, e até o céu dos céus, não te poderiam conter, quanto menos esta casa que eu tenho edificado» (1Rs 8,27). Assim, Deus não habita apenas lá no céu, mas está presente em toda a criação. Na plenitude dos tempos ele vem habitar entre nós através da Palavra que se fez carne (Jo 1,14).
E uma vez habitando não somente no céu, mas em toda parte, Deus condivide sua vida divina com os eleitos na eternidade . A nova Jerusalém é figura desta realidade: «naquele dia o renovo do Senhor será cheio de beleza e de glória; e o fruto da terra excelente e formoso para os que escaparem de Israel. E acontecerá que aquele que for deixado em Sião, e ficar em Jerusalém será chamado santo; todo aquele que estiver inscrito entre os viventes em Jerusalém» (Is 4,2-3). A figura do novo templo, da Sião reconstruída e da montanha santa, também representa a imagem do céu condividido por Deus com seus eleitos: «e farei com eles uma aliança de paz; e será uma aliança perpétua. E os estabelecerei, e os multiplicarei, e porei o meu santuário no meio deles para sempre. E o meu tabernáculo estará com eles, e eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo. E os gentios saberão que eu sou o Senhor que santifico a Israel, quando estiver o meu santuário no meio deles para sempre» (Ez 37,26-28). O que confirma teologicamente que Jesus vem para fazer novas todas as coisas e resgatar o paraíso perdido para todos. O tabernáculo nada mais é do que o Santíssimo que tem permanecido no meio do povo de Deus ao longo dos anos. A nova e eterna aliança é firmada pelo sangue de Jesus Cristo derramado para o perdão dos pecados de todos.
3. A compreensão neo-testamentária do céu
O céu, no NT, está relacionado com o próprio nome de Deus: «assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus» (Mt 5,16). Mesmo estando nos céus ele é o nosso Pai. A adoção filial nos foi dada por meio de Jesus Cristo, o qual nos ensinou que agora temos um Pai nos céus. O que confirma que Deus não ficou apenas nos céus, mas veio fazer morada em nosso meio. A oração do Pai-Nosso também revela o resgate da relação entre o ser humano e Deus: «portanto, vós orareis assim: “Pai nosso, que estás nos céus, santificado seja o teu nome”» (Mt 6,9). Uma vez que Deus é nosso Pai, somos todos irmãos e por isso, se vivermos em comunhão, anteciparemos o céu aqui na terra: «nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros» (Jo 13,35). Este é o sinal que todo cristão deve trazer na fronte.
Além de Deus e dos seus eleitos que habitam no céu, nele também está Cristo, nossa esperança: «tendo iluminados os olhos do vosso entendimento, para que saibais qual seja a esperança da sua vocação, quais as riquezas da glória da sua herança nos santos e qual a excelente grandeza do seu poder sobre nós, os que cremos, segundo a operação da força do seu poder, que manifestou em Cristo, ressuscitando-o dentre os mortos, e pondo-o à sua direita nos céus» (Ef 1,18-20) . E assim como ressuscitou Jesus, ele também nos ressuscitará: «isso significa que o próprio Deus abre para a pessoa novas dimensões de vida, dimensões que chamamos salvação, dimensões que chamamos céu» .
Os eleitos devem buscar as coisas do alto, onde ele se encontra: «portanto, se já ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas que são de cima, onde Cristo está assentado à destra de Deus. Pensai nas coisas que são de cima, e não nas que são da terra; porque já estais mortos, e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus» (Cl 3,1-2). O que quer dizer que o ser humano deve viver na terra em conformidade com a Palavra de Deus para que possa participar de sua glória. Numa palavra, somos chamados a buscar as coisas do alto desde já, aqui na terra, antecipando o que será na eternidade .
Jesus Cristo promete que preparará muitas moradas para os eleitos de Deus: «não se turbe o vosso coração; credes em Deus, credes também em mim. Na casa de meu Pai há muitas moradas; se não fosse assim, eu vo-lo teria dito. Vou preparar-vos lugar. E quando eu for, e vos preparar lugar, virei outra vez, e vos levarei para mim mesmo, para que onde eu estiver estejais vós também» (Jo 14,1-3). E ele preparou um lugar para nós no céu não como quem prepara uma casa para outro aqui na terra, ou mesmo uma hospedagem, mas dando a sua própria vida na cruz. Assim, para habitar nas moradas eternas do céu, será necessário deixar que ele faça morada em nossas vidas (cf. Jo 14,23).
Deste modo, a nossa herança já nesta vida e também na outra, graças a Jesus Cristo, é o céu: «mas a nossa cidade está nos céus, de onde também esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará o nosso corpo abatido, para ser conforme o seu corpo glorioso, segundo o seu eficaz poder de sujeitar também a si todas as coisas» (Fl 3,20-21; cf. Cl 1,5). O paraíso perdido não passou a ser uma realidade do passado evaporada no tempo e no espaço, mas sim uma meta . E se trata de uma herança que não se corrompe: «bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo que, segundo a sua grande misericórdia, nos gerou de novo para uma viva esperança, pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos, para uma herança incorruptível, incontaminável, e que não se pode murchar, guardada nos céus para vós» (1Pd 1,3-4). Portanto, ao invés de ajuntar tesouros na terra somos chamados a ajuntá-los no céu: «mas ajuntai tesouros no céu, onde nem a traça nem a ferrugem consomem, e onde os ladrões não minam nem roubam» (Mt 6,20). O que é motivo de alegria para nós: «mas, não vos alegreis porque se vos sujeitem os espíritos; alegrai-vos antes por estarem os vossos nomes escritos nos céus» (Lc 10,20). Desde já, então, os nomes daqueles que são enviados por Jesus Cristo e cumprem sua missão, possuem a certeza da comunhão com ele nos céus. E a alegria nossa pode se dar mesmo em meio às tristezas por causa da perseguição dos nossos inimigos.
No céu não haverá mais choros ou ranger de dentes, pois viveremos de Deus: «amados, agora somos filhos de Deus, e ainda não é manifestado o que havemos de ser. Mas sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele; porque assim como é, o veremos» (1Jo 3,2). Deste modo, é necessário termos confiança e perseverar: «por isso estamos sempre de bom ânimo, sabendo que, enquanto estamos no corpo, vivemos ausentes do Senhor porque andamos por fé, e não por vista. Mas temos confiança e desejamos antes deixar este corpo, para habitar com o Senhor» (2Cor 5,6-8).
Uma vez habitando com Cristo nos céus, cantaremos um canto novo: «e cantavam um novo cântico, dizendo: “digno és de tomar o livro, e de abrir os seus selos; porque foste morto, e com o teu sangue compraste para Deus homens de toda a tribo, e língua, e povo, e nação; e para o nosso Deus os fizeste reis e sacerdotes; e eles reinarão sobre a terra”. E olhei, e ouvi a voz de muitos anjos ao redor do trono, e dos animais, e dos anciãos; e era o número deles milhões de milhões, e milhares de milhares, que com grande voz diziam: “digno é o Cordeiro, que foi morto, de receber o poder, e riquezas, e sabedoria, e força, e honra, e glória, e ações de graças”» (Ap 5,6-12). Canto que somos convocados a cantar desde já, na terra, a partir da comunhão com ele.
O número dos assinalados que farão parte da morada celeste é infinito: «e vi outro anjo subir do lado do sol nascente, e que tinha o selo do Deus vivo; e clamou com grande voz aos quatro anjos, a quem fora dado o poder de danificar a terra e o mar, dizendo: “não danifiqueis a terra, nem o mar, nem as árvores, até que tenhamos assinalado nas suas testas os servos do nosso Deus”. E ouvi o número dos assinalados, e eram cento e quarenta e quatro mil assinalados, de todas as tribos dos filhos de Israel”» (Ap 7,2-4). E somente estes poderão louvá-lo: «e olhei, e eis que estava o Cordeiro sobre o monte Sião, e com ele cento e quarenta e quatro mil, que em suas testas tinham escrito o nome de seu Pai. E ouvi uma voz do céu, como a voz de muitas águas, e como a voz de um grande trovão; e ouvi uma voz de harpistas, que tocavam com as suas harpas. E cantavam um como cântico novo diante do trono, e diante dos quatro animais e dos anciãos; e ninguém podia aprender aquele cântico, senão os cento e quarenta e quatro mil que foram comprados da terra» (Ap 14,1-3). Cento e quarenta e quatro mil aqui não quer dizer um número exato, mas infinito. Alguns dizem que se trata do número 12 que representa as 12 tribos de Israel no AT, multiplicado pelo número dos apóstolos (12). O resultado é 144 que multiplicado por 1000, número que indica o infinito, soma 144.000.
Todos os bons farão parte da vida celeste quando Jesus vier na sua glória para julgar o mundo: «e quando o Filho do homem vier em sua glória, e todos os santos anjos com ele, então se assentará no trono da sua glória; e todas as nações serão reunidas diante dele, e apartará uns dos outros, como o pastor aparta dos bodes as ovelhas; e porá as ovelhas à sua direita, mas os cabritos à esquerda. Então dirá o Rei aos que estiverem à sua direita: “vinde, benditos de meu Pai, possuí por herança o reino que vos está preparado desde a fundação do mundo; porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede, e destes-me de beber; era estrangeiro, e hospedastes-me; estava nu, e vestistes-me; adoeci, e visitastes-me; estive na prisão, e fostes ver-me”» (Mt 25,31-36). Uma vez sendo um instrumento nas mãos de Deus eles nem mesmo terão consciência do bem que fizeram: «Senhor, quando te vimos com fome, e te demos de comer? Ou com sede, e te demos de beber? E quando te vimos estrangeiro, e te hospedamos? Ou nu, e te vestimos? E quando te vimos enfermo, ou na prisão, e fomos ver-te?» (Mt 25,37-39). Na verdade, em vida procuraram servir somente a Deus, por isso se reconheciam como inúteis: «assim também vós, quando fizerdes tudo o que vos for mandado, dizei: somos servos inúteis, porque fizemos somente o que devíamos fazer» (Lc 17,10). Então, tudo o que faziam era atribuído como sendo obra de Deus realizada por meio deles.
Os que forem colocados à direita receberão o prêmio da vida eterna, viverão em comunhão plena no reino dos céus . Ao contrário, os que forem colocados à esquerda irão para o castigo eterno, recebendo como paga o inferno por tê-lo antecipado em vida. Isto porque «seria conveniente para muitos senhores se com a morte tudo fosse pago; se a dominação dos senhores, se a servidão dos servos fossem ratificadas para sempre. Seria conveniente para muitos senhores se eles eternamente continuassem senhores em túmulos particulares e caros e os seus servos, em valas comuns. Mas uma ressurreição virá, bem diferente, totalmente diferente do que pensávamos; virá uma ressurreição que será levante de Deus contra os senhores e contra o senhor de todos os senhores: a morte» .
Os que não forem nem para a direita e nem para a esquerda de Deus, deverão se purificar no purgatório. Porém, Deus não quer que ninguém seja condenado, mas que todos se salvem: «todos os povos... têm igualmente um único fim comum, Deus, cuja Providência, testemunhos de bondade e planos de salvação abarcam a todos...» .
A condenação, então, é resultado da indisposição em converter-se: «se no momento mais nítido de liberdade ele (o ser humano) pronunciar o seu não, ele o expressará de fato com todo o seu ser; ele teima na sua negação e inclusive ele mesmo acaba por tornar-se um não radical. Opta por si mesmo por todo o sempre e tem que aturar a si próprio toda a eternidade; tem que errar no tenebroso vazio da sua própria existência para todo o sempre» .
4. O céu como comunhão de vida
É difícil acreditarmos na existência do céu, ou se quiser, do paraíso como um estado de vida onde reina a comunhão. Isto porque vivemos fora do mesmo, sendo que, devido à desobediência, o ser humano foi afastado da presença de Deus: «e o Senhor Deus o expulsou do jardim do Éden para cultivar o solo de onde fora tirado. Ele baniu o homem e colocou, diante do jardim do Éden, os querubins e a chama da espada fulgurante para guardar o caminho da árvore da vida» (Gn 3,23-24). A expulsão provocada pela desobediência ao Criador nos proporcionou outras experiências de vida: «à mulher, o Senhor disse: “multiplicarei as dores de tuas gravidezes, na dor darás à luz filhos. Teu desejo te impelirá ao teu marido e ele te dominará”. Ao homem, ele disse: “porque escutaste a voz de tua mulher e comeste da árvore que eu te proibira comer, maldito é o solo por causa de ti! Com sofrimentos dele te nutrirás todos os dias de tua vida”» (Gn 3,16-17).
A partir disso, por algum tempo, a humanidade passou a estar impedida de ver a face de Deus plenamente. Por não suportar viver em sua presença, uma vez expulsa do paraíso, começa a caminhar sem rumo e direção, vivendo apenas de esperança. A esperança é de que Deus enviará o Messias que novamente proporcionará a mediação, ou melhor, a reconciliação entre ela e o Criador. No fundo, ele será a única possibilidade de mediação entre o ser humano e Deus: «porque há um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo homem» (1Tm 2,5). Enquanto isso não acontece, o ser humano tem de caminhar no deserto, experimentando o êxodo de quem não possui mais pátria. E deserto aqui não quer dizer apenas um lugar pleno de areia, formado por dunas e de temperatura elevada, mas também o caminhar na ausência de Deus, com saudades do paraíso perdido. Assim, o mesmo passa a ser uma meta a ser atingida. Neste caminhar a ressurreição não se torna, por ora, possível . Todos os que morrem, bons e maus, justos e injustos vão para o mesmo lugar, sendo que, os justos terão que aguardar a libertação por meio de Jesus Cristo.
No latim, o termo inferno quer dizer lugar inferior ou abismo. Já no AT o mesmo é definido como lugar dos mortos (xeol), ou mesmo gruta subterrânea. Ainda na concepção vetero-testamentária, todos os mortos, justos e injustos, possuem como destino final o xeol ou a referida gruta. No livro do Deuteronômio encontramos uma idéia de tais lugares: «porque um fogo se acendeu na minha ira, e arderá até ao mais profundo do inferno, e consumirá a terra com a sua colheita, e abrasará os fundamentos dos montes» (Dt 32,22). O livro de Jó também faz uma referência à ida sem retorno para um lugar de tormento: «antes que eu vá para o lugar de que não voltarei, à terra da escuridão e da sombra da morte» (Jó 10,21).
Mas, se no AT a concepção era de que bons e maus iam para o mesmo lugar após a morte, com o progresso da Revelação, passou-se a entender que os bons possuirão um outro destino: «no seu abandono, Jesus apropria-se da dor e da morte do homem, da existência humana em si. Ele a vivencia na sua mais profunda e dolorosa realidade, na perda de Deus» .
Se os maus irão para a perdição eterna, os bons ressuscitarão para a vida: «e muitos dos que dormem no pó da terra ressuscitarão, uns para a vida eterna, e outros para vergonha e desprezo eterno» (Dn 12,2). Deste modo, os ímpios ressuscitarão para o castigo: «eis que todos vós, que acendeis fogo, e vos cingis com faíscas, andai entre as labaredas do vosso fogo, e entre as faíscas, que acendestes. Isto vos sobrevirá da minha mão, e em tormentos jazereis» (Is 50,11). O livro do profeta Isaías também confirma o destino dos ímpios depois da morte, por causa de suas prevaricações: «e sairão, e verão os cadáveres dos homens que prevaricaram contra mim; porque o seu verme nunca morrerá, nem o seu fogo se apagará; e serão um horror a toda a carne» (Is 66,24).
Na bíblia aparece também a imagem da Geena. Na cidade de Jerusalém é presente até hoje um vale considerado como um lugar de culto idolátrico: «portanto, eis que vêm dias, diz o Senhor em que não se chamará mais Tofete, nem Vale do Filho de Hinom, mas o Vale da Matança; e enterrarão em Tofete, por não haver outro lugar» (Jr 7,32; cf. 19,6). Trata-se da lixeira da cidade, o que conhecemos por boca-do-lixo: «e edificaram os altos de Tofete, que está no Vale do Filho de Hinom, para queimarem no fogo a seus filhos e a suas filhas, o que nunca ordenei, nem me subiu ao coração» (Jr 7,31).
Jesus Cristo, depois de sua paixão e morte, desce à mansão dos mortos. Descida que tem uma dimensão cósmica do mistério pascal. O mundo, segundo a concepção hebraica era imaginado como sendo uma casa. A mesma era dividida em três compartimentos. O primeiro compartimento era uma gruta subterrânea onde se encontrava a morada dos mortos. No rés-do-chão se localizava a morada dos homens. Já o palácio de Deus era imaginado como sendo parte integrante do primeiro andar. Assim sendo, uma vez sepultado Jesus penetra no primeiro compartimento: «porque também Cristo padeceu uma vez pelos pecados, o justo pelos injustos, para levar-nos a Deus; mortificado, na verdade, na carne, mas vivificado pelo Espírito» (1Pd 3,18). Pela sua ressurreição ele participa do palácio dos homens e na sua ascensão ele faz parte do palácio de Deus: «por isso diz: “subindo ao alto, levou cativo o cativeiro, e deu dons aos homens”» (Ef 4,8s).
A «descida» de Jesus Cristo à mansão dos mortos representa o seu triunfo sobre a morte: «eu sou o vivente, estive morto, mas eis aqui estou vivo para todo o sempre. Amém. E tenho as chaves da morte e do inferno» (Ap 1,18). Ele é o anjo que tem o poder sobre o abismo: «e vi descer do céu um anjo, que tinha a chave do abismo, e uma grande cadeia na sua mão» (Ap 20,1).
Deste modo, ao cumprir-se a plenitude dos tempos, Jesus Cristo vem para tornar o acesso a Deus possível. A comunhão entre criatura e Criador é restabelecida. Ele proporciona a reconciliação entre a humanidade e Deus, dando sentido ao nosso caminhar: «o vulto do reconciliador, do homem-Deus Jesus Cristo, põe-se entre Deus e o mundo, coloca-se no centro de tudo que acontece. Nele se desvenda o mistério do mundo, assim como nele se revela o mistério de Deus. Não há abismo do mal que possa ficar oculto àquele por quem o mundo é reconciliado com Deus» . É assim que, depois de sua morte o véu do templo se rasga de alto a baixo e a humanidade novamente pode ter acesso ao sagrado à comunhão perdida: «era já mais ou menos a hora sexta quando houve trevas sobre a terra inteira até à hora nona, tendo desaparecido o sol. O véu do Santuário rasgou-se ao meio, e Jesus deu um grande grito: “Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito”» (Lc 23,44-46). A partir disso, muitos justos que adormeceram em Jesus Cristo, esperando sua vinda, ressuscitam para a felicidade eterna: «abriram-se os túmulos e muitos corpos dos santos falecidos ressuscitaram. E, saindo dos túmulos após a ressurreição de Jesus, entraram na Cidade Santa e foram vistos por muitos» (Mt 27,52-53) .
Porém, uma vez tendo ocorrido a expulsão por causa da desobediência, a plenitude da comunhão que existia no paraíso, não poderá ser mais vivida a qualquer hora, em todo lugar, enquanto estamos a caminho. É por isso que o cristão não pode confessar somente a vida divino-gloriosa de Jesus. Se assim fosse faltaria a esta confissão a expressão de nossa condição. Por assim ser, a vida atual de Cristo é a nossa no sentido de que é uma vida que superou o destino. Então o inferno não é outra coisa que o efeito das ações dos homens. Por isso o inferno só se torna irremediável para ele se ele quiser torná-lo irremediável. Neste sentido, o que Jesus enfrentou nós também o enfrentaremos a partir de sua vitória e, por conseguinte, na esperança.
Mesmo que Jesus Cristo tenha novamente proporcionado o acesso ao céu, o mesmo só poderá ser vivido plenamente de novo na ressurreição para a eternidade: «e irão estes para o tormento eterno, mas os justos para a vida eterna» (Mt 25,46). Contudo, não se deve descartar essa possibilidade de vez: «eu vos esconjuro, irmãos meus, permanecei fiéis à terra e não creiais naqueles que vos falam em esperanças sobre-terrenas! Consciente ou inconscientemente são uns envenenadores. São desprezadores da vida, moribundos e eles mesmos envenenados. A terra está cansada deles: que se vão de uma vez» . Mas também não devemos dar importância somente ao céu, nos esquecendo da terra: «na teologia esta concepção se traduziu numa visão alienante do reino de Deus. Este era projetado e esperado somente no futuro. Abandonava-se tudo para aguardar o irromper, dos céus, da novidade salvífica de todas as coisas» . Dá-se aqui uma visão prejudicial de um Deus sem mundo. Esta concepção de um Deus sem mundo ajudou certamente a gerar nos tempos modernos a visão de um mundo sem Deus. Contudo, «o reino já está presente em mistério aqui na terra. Chegando o Senhor ele se consumará» .
É por isso que o que conta não é apenas a terra, o viver aqui que começa e termina nesse mundo e, nem mesmo uma visão alienante do céu que prorroga tudo para depois. O que conta é viver essa vida enquanto estamos a caminho rumo ao céu, tendo presente o que virá depois, seja nas alegrias, seja nas tristezas cotidianas: «a felicidade que na terra gozamos, o bem que fazemos e as alegrias que saboreamos no dia-a-dia da existência são já vivência do céu, embora sob forma ambígua e deficiente» .
Deste modo, vez ou outra, antecipamos o céu aqui na terra, mesmo em meio ao sofrimento, vivendo em comunhão: «eu entendo que os sofrimentos do tempo presente nem merecem ser comparados com a glória que deve ser revelada em nós. De fato, toda a criação está esperando ansiosamente o momento de se revelarem os filhos de Deus. Pois a criação ficou sujeita à vaidade, não por sua livre vontade, mas por sua dependência daquele que a sujeitou; também ela espera ser libertada da escravidão da corrupção e, assim, participar da liberdade e da glória dos filhos de Deus» (Rm 8,18-21).
Contudo, mais uma vez temos que ter a percepção que o estar na presença de Deus constantemente, só será possível na eternidade, desde que em vida, nos deixemos conduzir de modo obediente por Jesus Cristo: «a plenitude anunciada por Jesus Cristo e ardentemente desejada por todo aquele que nele crê e espera não é somente aceno de um remoto futuro, mas consumação e realização absoluta de um encontro e de uma comunhão presentes em interação de já e ainda não na vida e na história concreta dos homens» . Aqui, a vigilância é fundamental: «por isso, é importante para cada um de nós permanecer vigilante e esforçar-se ao máximo para não sucumbir no caminho e assim falir no próprio destino» . Mas, se isso acontecer, Deus está sempre disposto a nos acolher no céu, libertando-nos da escravidão da morte, e acolhendo-nos em seus braços. A passagem bíblica sobre o filho pródigo deixa isso claro: «e, levantando-se, foi para seu pai; e, quando ainda estava longe, viu-o seu pai, e se moveu de íntima compaixão e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou» (Lc 15,20).
É por isso que, em nosso caminhar após a expulsão da presença de Deus, ora experimentamos a comunhão com ele, conosco mesmos, enfim, com o próximo e com todas as criaturas, ora não. Trata-se de uma utopia da fraternidade universal . No fundo, o ser humano só a vive se dispondo a não permanecer fechado em si mesmo. E ao sair de si mesmo e amar, ele encontra sua plena realização. Por isso ele é chamado a entrar em comunhão com os outros, passando a não destruir sua liberdade. O resultado de tal dinâmica é a disposição em usar seu ser livre para dedicar-se ao serviço dos outros. Nessa doação no amor nossa vida se plenifica e o paraíso passa a ser a realização perfeita da vida humana. Realização que se dá na comunhão e no amor com os outros e com Deus: «a um grande movimento que se esvazia a si mesmo (...) e, quando estiver consumado, esse não será mais o “nosso” próprio amor, mas sim, virá dos outros; será mero presente» .
Quando a comunhão não se faz presente então experimentamos o contrário do céu. Neste estágio de nossa vida a divisão se apresenta. Resulta num modo de viver que chamamos de experiência do inferno. Isto porque a humanidade aprendeu a conhecer a morte, o sofrimento, ou seja, tomou conhecimento do bem e do mal: «portanto céu e inferno, purgatório e juízo não são realidades que irão começar a partir da morte. Mas já agora podem ser vividas e experimentadas, embora de forma incompleta. Elas começam a existir aqui na terra, vão crescendo até que na morte se dá um desabrochar pleno: ou para a frustração para aquele que se orientou negativamente e fechou-se à luz do sentido, ou para a plena realização para aquele que se manteve permanentemente aberto a toda realidade, especialmente para Deus» . E no juízo final o ser humano não será julgado isoladamente: «portanto, o ser humano não se apresenta perante Deus como pessoa isolada, mas, isto sim, juntamente com todas as estruturas do mundo sobre as quais ele mesmo exerce influência e que por sua vez o influenciaram e o determinaram. Todas elas são parte do “julgamento”» .
O que conta acima de tudo é o amor a nós mesmos, a Deus, ao próximo, bem como a todas as outras criaturas, pois não temos condições de ver ou explicar de uma vez por todas, o que Deus tem preparado para aqueles que em vida vivem em conformidade com o maior de todos os mandamentos.
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Abreviaturas:
2C CELANO, T., Vida II – Escritos de São Francisco, Petrópolis 1988.
AG Ad Gentes
AT Antigo Testamento
Aug Augustinianum
BAC Biblioteca de Autores Cristianos
cf. conforme
DoC Doctor Communis
DThC Dictionnaire de Théologie Catholique
eds. editores
1. A.R. van der WALLE, Bis zum Anbruch der Morgenroete, 243 (a tradução é minha). Cf. N. CAMILLERI, «Lo spirito e la materia nell’uomo dalla morte», 223-230; R. GLEASON, «Toward a Theology of Death», 39-60; P. GLORIEUX, «In hora mortis», 185-216; M.J. O’CONNEL, «The Mystery of Death», 431-439; C. POZO, «Teologia del más Allá», 220-225.
2. B.E. DALEY, Origens da Escatologia Cristã, 116.
3. Cf. GS, 318.
4. Cf. B.E. DALEY, Origens da Escatologia Cristã, 50.
5. GS, 250.
6. Cf. R. DESCARTES, Os pensadores, 93.
7. Cf. P. BERNARD, «Ciel», 2478; O. BETZ, «Der Himmel», 269-283; L. BOROS, «Der neue Himmel und die neue Erde», 261-270.
8. A humanidade aqui é entendida como sendo Adão e Eva, nossos primeiros pais.
9. Cf. GS, 251.
10. Na maioria das vezes que nos referirmos à comunhão de agora em diante, estaremos aludindo à comunhão com Deus. Mas não apenas esta. Também à comunhão conosco mesmos, bem como com o próximo e com todas as criaturas.
11. D. BONHOEFFER, Ética, 15.
12. Cf. A. SILESIUS, Il pellegrino cherubico, 156.
13. R.J. BLANK, Escatologia da pessoa, 290.
14. Cf. ainda Ap 19,9.
15. Cf. GS, 251.
16. Cf. B.E. DALEY, Origens da Escatologia Cristã, 81.
17. 2C, 216.
18. R.J. BLANK, Escatologia da pessoa, 292.
19. M. HEIDEGGER, Sein und Zeit, 259 (a tradução é minha).
20. Cf. M. KEHL, Eschatologie, 290.
21. Cf. J. DREISSEN, «Theologische Besinung über den Himmel», 251-258; H. MÜLLER, «Himmel», 405-409; R. TROISFONTAINES, «Le ciel», 229-249.
22. Sobre o significado da ressurreição de Jesus, cf. R.J. BLANK, «O significado escatológico da ressurreição», 81-88.
23. R.J. BLANK, Escatologia da Pessoa, 288.
24. Cf. O. BETZ, «Der Himmel», 262-280; L. BOROS, «Der neue Himmel und die neue Erde», 263-279; J. DREISSEN, «Theologische Besinung über den Himmel», 251-258; H. MÜLLER, «Himmel», 401-409; R. TROISFONTAINES, «Le ciel», 229-240.
25. Cf. B.E. DALEY, Origens da Escatologia Cristã, 100.
26. Cf. P. SESSA, «Desiderio dell’eternità e della vita eterna», 161-171.
27. K. MARTI, Schon wieder heute, 55 (a tradução é minha). Cf. M.J. O’CONNEL, «The Mystery of Death», 434-442; C. POZO, «Teologia del más Allá», 218-223.
28. NA, 1.579. Para maiores detalhes, cf. também AG, 879; GS, 288.
29. L. BOROS, Erloestes Dasein, 101 (a tradução é minha).
30. Para um maior aprofundamento sobre a ressurreição dos mortos, cf. di GIOVANNI, «La partecipazione alla “immortalità” di Dio», 229-236. Cf. ainda E. BETTENCOURT, «A vida que começa com a morte», 45-55; L. BOFF, A nossa ressurreição na morte, 10-15; M. BORDONI, Dimensioni antropologiche della morte, 25-33.
31. G. ROSSÉ, Jesus in seiner Verlassenheit, 69 (a tradução é minha).
32. D. BONHÖEFFER, Ética, 44.
33. A ressurreição de justos no AT é um sinal da era escatológica (cf. Is 26,19; Ez 37; Dn 12,2). Uma vez que eles foram libertados do Hades pela morte de Cristo (cf. Mt 16,18), esperam a sua ressurreição para entrar com ele na Cidade Santa, isto é, na Jerusalém Celeste (Ap 21,2.10; 22,19). Esta é a concepção presente também nos antigos Padres da Igreja. A descida de Cristo à mansão dos mortos é, então, uma das primeiras expressões da fé na libertação dos mortos (cf. 1Pd 3,19).
34. F. NIETZCHE, Also sprach Zarathustra, 3 (a tradução é minha).
35. L. BOFF, Vida para além da morte, 27. Cf. N. CAMILLERI, «Lo spirito e la materia nell’uomo dalla morte», 223-234; R. GLEASON, «Toward a Theology of Death», 39-68; P. GLORIEUX, «In hora mortis», 185-216.
36. GS, 318.
37. L. BOFF, Vida para além da morte, 31.
38. J. B. LIBÂNIO, Escatologia Cristã, 278.
39. R.J. BLANK, Nossa vida tem futuro, 192.
40. Cf. J.L.R. de la PEÑA, La pascua de la creación, 218.
41. L. BOROS, Mysterium mortis, 54 (a tradução é minha). Cf. N. CAMILLERI, «Lo spirito e la materia nell’uomo dalla morte», 223-234; R. GLEASON, «Toward a Theology of Death», 39-68.
42. L. BOFF, Vida para além da morte, 26-27. Cf. P. GLORIEUX, «In hora mortis», 185-216; M.J. O’CONNEL, «The Mystery of Death», 434-442; C. POZO, «Teologia del más Allá», 218-223.
43. R.J. BLANK, Escatologia da pessoa, 304. Para maiores detalhes, cf. J. RIVIÈRE, «Lê Role du démon au jugement», 43-64.
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